sexta-feira, 30 de janeiro de 2009


Maturidade


Aquecimento global. Está nas manchetes, na mídia, nas rodas de entendidos e na boca do povo.
Estamos sentindo na pele os efeitos desse calor infernal.
Para complicar-me mais está em mim o “aquecimento climatério”. Um fogacho invade meu corpo deixando-me louca. Coisas de mulheres!
Saindo do banho enrolada na toalha, paro diante do espelho e fico a contemplar o meu corpo.
Cabelos brancos são lindos... Na cabeça da vovozinha, não na minha. Cosméticos modernos resolvem essa parte.
Mas, e o resto? Temos que assumir a realidade.
Pouco abaixo de meus joelhos noto umas pintinhas brancas. Assustada, ligo para o dermatologista e marco uma consulta urgente.
- Isso não é nada importante, são pequenas sardas, comuns em sua idade. Diz a doutora.
Passo então a prestar atenção nas outras mulheres e percebo que e normal. Quase todas de minha idade as têm.
Nas anti-salas de consultórios as conversas tornam-se confidências.
- Tenho que tirar o meu útero. Diz pausadamente a mulher que está ao meu lado aguardando a consulta com o ginecologista.
- útero só serve para gerar bebês e dar lucro às fábricas de absorventes.
Comenta sem refletir na gravidade do momento para aquela mulher, uma mocinha que está ao lado.
- Não é bem assim. Lembro-me bem, parece que foi ontem. Quando veio minha primeira menstruação apesar de todo o incômodo eu me senti mulher! Completa, capaz, saudável...
E quando tive meu filho. Oh meu Deus! Nada é maior, mais bonito, mais sublime!
E agora será arrancado de mim esse “pedaço” que me deu tanta dignidade e orgulho. Uma parte de valor imensurável do meu eu mulher...

E sempre que estou diante do espelho, lembro-me daquela mulher!
Adoro meus seios. Apesar de não serem como alguns anos atrás, são bonitos e sensuais.
E vem um idiota de médico com aquele discurso medíocre, chinfrim...
- Vamos retirar uma parte de teus seios...
Talvez seja necessária a retirada total...
Um processo simples... Conforme o tratamento, teus cabelos também podem cair...
Para os diabos!
O momento é meu, a dor é minha!
Mutilações...
Diante do espelho eu vejo a mulher!
Independente das perdas e danos
Das frustrações e desenganos...
Uma linda mulher!

Cida Araújo (Trecho do livro: O Manacá Florido da autora)
www.cidaarujo2007poetisa.blogspot.com